eu de mim

31 agosto 2006

dia-me

me parece o dia morno
o dia sono
me parece qualquer coisa de soar o nariz
sulcar a carne para movê-la de mim
parece o dia sono
vago
sinal de aceno
relógio de bolso
vão
parece dia solo
nem sol
vestígio de chuva no pranto da calçada
parce o dia calha
barulhinho do dia começando
parece o dia solto
pra lá daqui
me pareço dia vadio vasto
abraço dia
lambo-lhe a face
farpa
o dia duro
o dia dia
mais chuva que se anuncia
nessa hora de pouca escrita do dia que se inicia.

24 agosto 2006

fonte de manoel


vestígio de mariposa
tetos de asas esconderijos
invasões de oceanos pela janela
o corpo esconderijo
mariposa flutuando
rio de trovoadas que se assuntam com o latido de jamelão
uivo cão
e tá tudo escondidinho
como no começo dos tempos
tudo ali, na mão
tudo pra ser um pouco mais que essa felicidade que tento esfregar na tua cara.

23 agosto 2006

ao diogo

19 agosto 2006

soleira de morte

são aquelas felicidades alheias que me interessam... aquelas sem retrato com pose! aquelas sem falso sorriso da tal felicidade comprada num supermercado de inconveniências. que se cheguem pela fresta tal como são. sem fita. interessam chegar na carne. no fio da pele. saibam como ler os recados deixados no canto do olho. sejam felizes para que se prezem. pra que se agüentem num dia de civilizada etiqueta . mas saibam de uma coisa, o que mais atenta por aqui é a relutância do rasgo. o risco. aquele riso forçado. aquele grosseiro desvelo de bom comportamento. aquilo afronta meia dúzia de guerras civis. não me cheguem como israel sobre beirute. não me venham com essa de vítimas gentis. assumam os ralos. as ruas. avenidas de contra-mão. assuntem mais que ratos. engulo para vocês um pouco mais de raiva... daquele mais que ressentimento pelas coisas nunca ditas. assumam suas fezes. fases. consumam-se num registro de gás. mas não te afastem do compromisso da tal felicidade. vejam que daqui consigo ver um pouco melhor os traços de uma cidade ilhada. o rabo de luzes que se fazem nesta noite de sexta-feira. um rastro de gente saindo pra beber. bebericar junto à conversa ilustrada dos gentios mal compreendidos. vejam como fica mais fácil falar daqui. vejam se falo daqui! claro que é um esconderijo malacabado, tal como esta conversa fiada. os sonhos têm me assustando um pouco. quero dormir menos. quero acordar pouco. é toda essa eletrônica de emails, orkuts, palavrinhas que não se comprometem com o que são, que acabam findando um dia inteiro frente ao consumo da tela do computador. fico parado, pensando, e tantando refletir sobre a condição de não haver vizinho. não haver ouvido. talvez a vítima não seja eu, mas aqueles que elegi como meus algozes. os verdadeiros culpados. super-heróis sem fantasia. sem vôo. sem acrobacia. seres finitos. sim, as pessoas que amo são finitas por elas mesmas. morrem. morrerão. eu também. mas quem me são? quantas delas terei de agüentar partir para mais lembrança assombrar?! quantas delas ainda quero por perto?! não tenho tanto receio da minha morte, mas sim a do outro. daquele que já veio e se instalou. daquele que me tomou pelo braço, e que amo. tá a vida cheia desses retratos jogados dentro de porta-retratos, álbuns, caixas, restos de memória... tá o cheiro pela casa me assoviando passarinhos noturnos. são os cães também que irão morrer. é a gata. o quintal. será que este bicho eletrônico fica? resta ele pra saber mais... até meu pai que nunca fiz já morreu! a morte me exagera. me grita. vasculha qualquer verbo a mais que se possa tomar pela mão para cair ladeira abaixo. que se acalmem os retratos de todas as caixas. pois os túmulos estão todos abertos. visitados nesta noite de hoje. os mortos dançam sobre a cabeça. e velam o corpo do vigía desta noite.

18 agosto 2006


16 agosto 2006

nem nome

13 agosto 2006

rostro

12 agosto 2006

velha senhora


casa carcomida
antiga velha carcomida
casa carcome tempo
cimento
carcome o ar
carcome a terra da parede
a casa antiga velha senhora morta-viva
casa tempo carcomida por mais de 30 anos
mais de 30 visitantes mais que 4 habitantes
filhosnetosmortossobrinhostios pela casa
cama
a grade
o corredor que engole saída

carcome o passar das horas
o tempo carcomido em casa

09 agosto 2006

conversinha

não que fique fechado. não me sinto desta forma. nem trancafiado em qualquer lugar. e também, não fico em algum lugar marcado. nem mesmo calado. pelo contrário, o vulto do silêncio é uma víbora que resulta em morte lenta. mas também gosto de tal ofício. exijo um pouco dele a maneira certa de me dizer algumas falas. no silêncio me crio. mas isso não quer dizer que iniba minha vontade de viver qualquer coisa. o negócio é o seguinte, se me exponho da forma que me exponho é porque me sinto devedor de mim para fazê-lo. muitas vezes não me censuro em dizer das coisas. muitas vezes erro por fazer isso. falo-me num critério de amarrações cotidianas a que estou atado e vivendo. o gosto desse tipo de expressão me revela sobre mim mesmo. o que escrevo diz respeito a esse exercício. é uma análise livre. vagabunda. sem critério. cambaleante. o que quer mesmo é descobrir a quantas ando por aí. a repetição me acompanha como ritmo das minhas paisagens cheias de memória. é falar comigo mesmo. estabelecer uma conversa franca com todos aqueles que vivem aqui. o corpo. o dedo. os ossos. pés. algum volume de alma. vários de mim. e por aí vão. não faço de mim literatura, mas um rascunho que saiba, de alguma forma, traduzir os montes de minhas coisas. sim, são para mim. mas também para quem dela queira se perguntar. vou jogando com esses sentidos para mais perto poder chegar a mim. mais vizinho. mais aqui. mais pra dentro. pro fundo. mais de mim, pois estou um tanto cansado de ver através dos outros minhas tolas expectavivas. quero ser esse conhecedor de mim. então, que cheguem os corredores, suas portas, janelas, condomínios, grades, porteiras, e tudo mais que possa compor um cenário do que criei para mim.

05 agosto 2006

lamicandacá

convido te sair daqui pra mais de tempo. mais de tempo pra sair daqui. mais de ti. mais que te convide. mais tempo. mais daqui. convido daqui. o tempo daqui. pra mais daqui. saia com o vestido que te caiba melhor ao moço. melhora o moço. veste pro moço a mais sem-vergonha das caras. inunda aqueles dedos com teu encharco de chuvas. água tua. represada. vem pra cá. sandália pra cá. caminha pro canto. vem depressa. parece que o frio faz esse convite. chega pra junto. afunda nos meus ouvidos tua manha necessária. encha-me de tuas meninices. cola figurinha. pula de brincar. salta pelo ombro. arrisca. vem, não te estranhe feliz. risonha é bem a tua cara. risonha bem a tua cara. salta do morro. arremeta vôo. saia disso daí. vem mais pra junto. junta tua cara com a minha. esteja mais pra cá. no meio daqui. no centro. correndo envolta. roda por cima. crava os dentes. arriba!!! salta, vem. salta! faz daquilo devagar. entrega na minha mão. devagarinho. mas não sai correndo. fica. não me distraia. atente-se à minha concentração. mania dessas coisas todas nossas. em frase. vai, saia novamente. volta pra ficar. fica ao lado. mais junto. mais juntinho. mais um tempo. só mais esse minutinho que falta pra começar novamente a madrugada. um toquinho de tempo. acolhe no teu verso toda essa vontade de cair na gargalhada por tanta peraltice. mas venha novamente. franca. farta. vem pra mais descrever meu exercício de te ver.

01 agosto 2006



útero de mim. nascido. proclamado. anunciado numa carta de recomendações. isso de mim. osso. berne ventilado. vida em si. chamamento de ruas. traves. arestas. tudo que chega por aqui. a falta de vento. o resto de tudo. o cadarço. o laço de fita numa cabeça. a menina torta. o samba sem exaltação. tudo que é via se morde num tráfego de boas intenções. músculo. força de expressão. a química escrita. o desenho rubro. traços mal coordenados. é daquilo que chega. que é. daquilo que não quer explicação. existe. movimento. é rebento. afirmação. é isso aqui. forca de uma escrita sem saída. exclamada! forçada a ter nela um dedo de prosa. um indício de que o verme quer mais é comer das tripas. autofagia. nascer novamente. trovar novos versos. morrer do veneno noturno. exilar meu fígado em algum boteco. bailar minha bilis. tontear os sentidos. perder o caminho do céu. sombrear coisas: árvore, jasmim, folha, girassol, a menina. sortear entre elas o caminho até aqui. reencontrá-las para mais tê-las. para mais sair daqui. ventaniar. ensolarar um quintal de invenções, e sair. sair novamente por aí.