eu de mim

11 junho 2006

postagem

Florianópolis, 11 de junho de 2006.

caro amigo,

e sabe o que mais? canso de escrever. não que pretenda com isso me virar escrevinhador dos meus sentimentos. não é isso. quero mais é saber de mim. digo pra mim. não existe mais ninguém pra esta escrita. não mergulho fazer disso aqui um mar de idéias, mas sentidos. prazeres e raivas. desejos e jogos. é bem difícil se saber. às vezes dá uma vontade danada de explodir palavras que rezem preces consagrando a minha vontade de viver. sim, gosto disso. gosto da vida que escolho a cada dia, mas devo confessar que sinto um certo domigo diante dela. uma véspera de segunda-feira. um medo diante do começo da semana. uma véspera que não admite uma lenta observação sobre ela. um comentário que fosse. não, devo ser objetivo. deve-se começar alçando dias. nada de improviso. ser amador não vale. a profissão de estar vivo instaura uma obrigação de terno e gravata. melhor a roupa do palhaço. a graça triste do palhaço. quase decadente, mas que espera ser. e sabe o que mais, caro amigo? tenho razões para crer que o mundo mais se parece com o tal personagem de picadeiro. de roupa colorida. e a máscara em que se escondem o riso, o riso, o riso e o riso. tudo muito estranho. isso de se esconder parece enlouquecer a minha pessoa. o riso. escondo o riso irônico para que me aceites. sei que és meu amigo, e convive comigo para que tenha segurança de que as tuas coisas possam ser ditas e guardadas. mas sabe de uma coisa? cansei desse verbo de ser. esperas o que de mim? uma risada comoda que te agrade? tudo isso parece demais para mim. não me agrado em ser desse vestido limpo e passado sobre a serenidade das coisas! quero que me vejas amarrotado, pois é assim que sou. assim que gosto de ser! um ser amarrotado. essa metáfora me atrai ao desconforto das minhas ignorâncias sobre mim. pois é isso que sou, ignorante de mim. eu não me sobro por aqui. limito-me ao exercício de uma conformidade absurda diante dos meus atos. não aguento mais o rolar das coisas sem que possa realmente me expôr diante do cotidiando corriqueiro. não te surpriendas se de repente esta carta não chegar para você, pois estou escrevendo-a mais para mim. preciso escrever mais para mim. não que esteja abandonando o velho caminho do abraço fraterno, mas preciso vasculhar mais essas coisas que não são tão fáceis de serem ditas! preciso ficar mais comigo! mas se por acaso esta carta chegar em tuas mãos é porque queria que soubesse mais de mim. queria compartilhar do desenho que tenho feito de mim todo esse tempo. queira bem esse amigo. acho que na verdade estou pedindo só um abraço. um forte abraço. que acolha todo esse sentimento de solidão que nos abarca diante da condição de estarmos vivos. pois não gosto, definitivamente não gosto de pensar na morte. por isso te lembro aqui de mim. que não se esgotem os sentidos que vou me dando para saber que estou vivo. acho que começo a perceber que invento para mim motivos para tal empreitada. invento e desinvento, pois as minhas ações têm sempre um movimento de casulo. e neste momento estou aqui dentro. bem dentro. é amigo, a vida me ensina a desconfiar das cousas. não que seja essencialmente pessimista. sobre isso já me falaram. acho que na verdade só me dou o dever em não querer esconder a minha verdade diante dos meus partos diários.

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

"é amigo, a vida me ensina a desconfiar das cousas."

e

eu cada dia mais desconfio da vida...

6:22 PM  
Anonymous Anônimo said...

Tb canso de escrever
Saco cheio duro de esvaziar
Fico aqui a pensar
Assim vou me perder?

5:47 PM  

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